Eu li o How Brands Grow, do australiano Byron Sharp, e usei os dados de marketing da Buser que eu tinha acesso para testar e confrontar os principais ensinamentos do livro. Nesse artigo eu conto um pouco da minha experiência e das conclusões que tive com esses testes.
Texto de Luiz Benicio Rosa
Quando assumi o marketing da Buser, senti como se precisasse parar o tempo, à la Josué, para lidar com a avalanche de responsabilidades que vieram junto. A empresa estava em plena transição de uma fase de hyper growth para um momento de eficiência, o que, em outras palavras, significava menos orçamento para branding. Era muita coisa para aprender e decisões importantes para tomar logo em seguida.
Com tantas opções de livros, cursos e artigos por aí, escolher o que estudar parecia uma missão impossível. Antes de maximizar o ROI do marketing, eu precisava maximizar o ROI do meu próprio tempo. Em uma dessas buscas pela internet, me inscrevi em uma mentoria do Google e acabei conversando com o Léo Longo. Entre diversas experiências compartilhadas e dicas valiosas, uma frase dele mudou tudo: “Você precisa ler How Brands Grow, do Byron Sharp.” Ah, outra ótima dica dele foi procurar uma turma muito boa de um tal Purple Metrics.
Como as marcas crescem
Para alguém que ama dados, o livro foi uma delícia. Ele introduz conceitos como disponibilidade mental e física, saliência, distintividade e a construção de estruturas de memória, mas permeia tudo isso com uma forte ênfase na abordagem científica e na busca por evidências. Mais do que isso, grande parte do conteúdo é dedicada a refutar teorias e práticas tradicionais do marketing. Era como se, além de satisfazer meu desejo por dados, eu estivesse recebendo uma revelação, a verdade escondida.
Duvidei, claro. Parecia bom demais para ser verdade. Decidi, então, colocar as teorias do livro à prova. Afinal, era simples: bastava analisar os números da Buser e verificar se eles se alinhavam às regras que o autor defendia com tanta convicção.
Os primeiros testes
O primeiro alvo dos meus testes foi a Lei 20:30:50. Segundo ela, os 20% dos compradores mais frequentes respondem por 50% das compras, enquanto os 50% dos compradores menos frequentes respondem por 20%, e os 30% intermediários respondem por 30%. Em resumo, os grupos 20:30:50 respondem por 50:30:20 das compras. O livro, como de costume, ainda provocava: “Se 80% dos seus clientes gerassem apenas 20% das suas vendas anuais, seria tentador ignorá-los. Mas quando esses compradores esporádicos representarem cerca de metade das vendas, você ainda vai querer deixá-los de lado?”
Os dados da Buser foram implacáveis. As proporções estavam lá, praticamente exatas, com variações mínimas de poucos pontos percentuais. Ainda não satisfeito, segmentei os dados, comparando períodos de crescimento acelerado com momentos de maior eficiência. Os números permaneceram consistentes; a lei estava correta em todos os cenários.
Revisei tudo meticulosamente. Sharp dizia que, ao avaliar um período de três meses, a parcela de Pareto se aproximaria de 35%, e que ao longo de um ano, aumentaria para 50% (ou seja, os 20% dos compradores mais pesados passariam a representar metade das vendas). Mais uma vez, ele estava certo. Foi aí que decidi documentar internamente a validação do livro, detalhando todas as evidências que encontrava, e envolver o time na discussão.
Frequência de compra
A próxima teoria a ser testada foi a Lei da Moderação do Comprador, que destaca a importância do período analítico nas avaliações. Em termos simples, no próximo período, seus 20% de clientes mais frequentes não serão tão ativos, os compradores esporádicos se tornarão mais engajados e alguns dos que não compraram antes passarão a comprar. Enquanto o computador processava os dados, eu torcia para que a lei se comprovasse. Seria decepcionante parar por aqui. Felizmente, os dados não me desapontaram: meus clientes mais frequentes compraram 15% menos, enquanto os clientes menos ativos aumentaram suas compras em 218%.
Além disso, percebi que a Buser não escapou da distribuição negativa binomial (NBD), que parece descrever as frequências de compra de todas as marcas. O gráfico até saiu com as barras em vermelho, imitando perfeitamente o gráfico da Coca-Cola presente no livro.
Como consequência dessa distribuição, que explica sua Lei da Dupla Penalização, Byron Sharp afirma que quando as marcas crescem ou diminuem, há muita mudança na penetração de sua categoria (o tamanho de sua base de compradores) e pouca mudança na frequência de compra. Segundo ele, os índices de frequência de compra das marcas maiores são apenas marginalmente superiores. Naturalmente, coloquei isso à prova, mas a essa altura já não tinha dúvidas. Como a Buser experimentou um crescimento acelerado por cinco anos, consegui avaliar a frequência de compra em diferentes fases, com variações no market share. Sem surpresas, a frequência de compra mudou pouco, mas sempre aumentou marginalmente com o crescimento do market share, exatamente como o livro previu.
Mas nossos clientes não são diferentes?
Sei que a história está começando a soar repetitiva, mas o alerta de spoiler já era esperado: Byron Sharp continuou acertando. Por exemplo, ele afirma que marcas concorrentes vendem para o mesmo tipo de pessoas e que, dentro da base de clientes de cada marca, há grande variação, mas essa variação é consistente entre as marcas. Embora a Buser ofereça uma solução diferente dentro da sua categoria, nossas pesquisas de comportamento do consumidor mostraram que os perfis dos nossos clientes são os mesmos que os da concorrência. Eles apenas buscam uma solução melhor.
A Lei da Duplicação de Compra de Sharp afirma que todas as marcas, dentro de uma categoria, compartilham sua base de clientes com outras marcas de acordo com o tamanho dessas marcas. Em outras palavras, todos compartilham muito com as grandes marcas e pouco com as pequenas. Comprovando essa teoria, a base de clientes que a Buser compartilha com outras empresas é exatamente proporcional à penetração de cada uma. As pequenas distorções observadas estavam dentro da margem de erro.
Outro ponto interessante foi que, ao serem perguntados de qual marca jamais comprariam, a esmagadora maioria dos respondentes não indicou nenhuma opção. Entre os poucos que responderam, o maior motivo (de longe) foi o desconhecimento da marca, seguido pela confiança na marca (indicativo de reputação) e pela dificuldade de compra. Isso reforça a importância da disponibilidade mental e física e corrobora a tese do livro sobre lealdade às marcas.
Distintividade
Para validar a importância da distintividade, analisei os resultados de uma pesquisa de recall de campanha. Os dados revelaram que o termo “Rosa” foi o segundo mais lembrado, destacando a relevância dos ativos distintivos para fazer o consumidor notar, reconhecer e lembrar a marca — afinal, a Buser é o app dos ônibus rosa. O termo mais lembrado foi “ônibus”, o que indica que ambos os critérios foram atingidos: a cor rosa se mostrou um ativo valioso, sendo lembrada por grande parte das pessoas e corretamente associada à Buser. Como bônus, a Buser também foi corretamente associada à categoria de transporte.
O preço não é tudo
Por fim, analisei as afirmações de Byron Sharp sobre preços: os consumidores não se limitam a uma única faixa de preço. A maioria compra em uma variedade de preços, e aqueles que compram em uma faixa também compram em outras, de acordo com o tamanho dessas faixas. Como a Buser oferece ônibus com diferentes tipos de assentos e preços variados, usei nossos dados de compra para testar essas afirmações.
Classifiquei os assentos cama e leito como premium, e os semi-leito e executivo como low-cost. Identifiquei a porcentagem de usuários que compraram tanto assentos premium quanto low-cost. Mais uma vez, os dados foram incrivelmente semelhantes a um exemplo do livro (consumo de café no Reino Unido). Cerca de 50% dos usuários premium também compram low-cost. Além disso, e novamente em linha com o que Sharp descreve, os compradores de uma classe de assentos compram outras classes de acordo com o market share dessas categorias — os percentuais de compradores de assentos low-cost que compraram leito e cama refletem o market share dessas classes.
O que essas descobertas impactaram no meu trabalho?
Compreender a fundo a teoria de Byron Sharp e suas implicações para o negócio da Buser não fez o tempo parar, como eu imaginava, mas acelerou significativamente o desenvolvimento da equipe, trazendo confiança e a certeza de que estávamos no caminho certo.
Essa compreensão orientou nossas decisões e serviu como fio condutor para iniciativas importantes, como o reposicionamento da marca. Ao revisitar nosso arquétipo, tom de voz e conceito visual, conseguimos torná-los mais consistentes entre si, mais alinhados à nossa essência e mais eficazes em gerar distintividade. As prioridades também mudaram: menos esforço em programas de fidelidade e mais ênfase na proximidade com planejamento e produto, visando aumentar a disponibilidade física. Os resultados? Até agora, só temos motivos para comemorar; o verdadeiro teste será o tempo.
Seguimos questionando o livro e colocando suas teorias à prova sempre que possível. Não somos seguidores inquestionáveis de tudo o que ele propõe, mas com o tempo, percebemos que ele acerta na maior parte das vezes. Hoje, ele funciona como uma bússola, um alerta constante que nos mantém no caminho virtuoso da geração de valor, sem distrações ou egoísmos.
Nas reuniões do time, é comum ouvir alguém questionar uma proposta com a frase: “Isso não está em linha com Byron Sharp!” Até mesmo nas reuniões de diretoria ou com os fundadores, invocamos esse australiano destemido. Somos muito gratos a ele e ao Léo Longo por ter nos apresentado suas ideias.
Sobre o autor
Luiz Benicio Rosa (Linkedin) é Chief Revenue Officer na Buser, responsável pelas áreas de marketing, growth, produto, planejamento e pricing da empresa.
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