Modelo clássico de pensar o marketing como funil faz parecer que jornada do consumidor é linear e que basta alimentar o topo para gerar vendas, mas na prática não é bem assim; segundo ciência do marketing, o primeiro passo é o marketing falar sobre disponibilidade
Bruno Capelas – Purple Metrics
Em qualquer curso de marketing ou reunião sobre estratégia, é bem capaz que ele esteja presente. O conceito de funil de marketing talvez seja tão frequente no dia a dia de quem trabalha na área que ele pode até ser mais usado que um funil de verdade – o objeto, de plástico ou de metal, que muitas vezes acaba esquecido no fundo da gaveta de cacarecos da cozinha, normalmente a que fica logo abaixo da gaveta de talheres. Por falar em ferramentas: às vezes, ele é tão falado que o funil dá a impressão de ser o verdadeiro canivete suíço do marketing.
Mas será que ele é tão necessário assim?
Em uma conversa recente no Purple Pills, nosso papo quinzenal sobre branding e growth, o COO Lucas Yokota e a product marketing manager Marina dos Anjos colocaram em dúvida a supremacia do funil – mostrando que a lógica estabelecida há mais ou menos um século por William W. Townsend para falar de vendas pode não fazer tanto sentido assim em algumas ocasiões.
Nesse texto, a gente vai continuar essa conversa, explicando que a jornada do consumidor talvez não seja tão linear quanto a de um líquido que cai gravitacionalmente em algum lugar por conta das paredes inclinadas do funil. Mais que isso, a gente também vai tentar pensar “fora do funil”, explicando conceitos como disponibilidade física e disponibilidade mental – que podem ajudar muito a gerar vendas, de acordo com a ciência do marketing. Vamos lá?
Os furos (de lógica) do funil de marketing
Como toda boa metáfora, o funil de marketing é muito útil pra muita gente porque ele simplifica algo que não é simples: a jornada do consumidor.
Parece fazer muito sentido a ideia de que alguém está a fim de comprar, mas não tem muita informação, e aos poucos vai ganhando interesse em um item, a ponto de tornar esse interesse em desejo – e o desejo em uma ação.
O problema é que essa ideia parece dar a impressão de que o marketing tem controle sobre as necessidades do consumidor. Mais que isso, usar o funil como um paradigma de como uma venda é gerada pode ser um problemão, dando a impressão de que basta colocar um monte de gente no topo do funil para conseguir que algum iluminado cliente compre o seu produto, apenas por obedecer a lei da gravidade.
Mas quem trabalha com marketing sabe que não é bem assim. “Parece que dá pra empurrar as pessoas pelo funil, mas não dá”, brincou a Marina. Mais que isso, a gente sabe que cada pessoa tem uma jornada própria – e que não basta apenas mandar um e-book cheio de conteúdo depois que alguém leu dois textos no seu blog para conseguir converter uma compra de alguns dígitos de reais. Consumidor nenhum fica pronto em 3 minutos, tal qual miojo.
A lógica do funil ainda ignora uma questão muito importante: as pessoas nem sempre estão considerando comprar algo. Na verdade, normalmente só cerca de 5% das pessoas estão realmente procurando consumir algo. E o seu trabalho como alguém que trabalha com branding, marketing e áreas correlatas é… sim, isso mesmo, estar na cabeça do consumidor – seja ele B2B ou B2C, inclusive.
Então, como gerar vendas?
Desde que o mundo é mundo – ou, pelo menos, desde que o capitalismo existe –, as pessoas se fazem essa pergunta. Felizmente, ao longo dos últimos anos, a quantidade de dados existentes sobre como as vendas funcionam tornou possível a criação do que se chama de “ciência do marketing”. Um dos caras que mais entendem do assunto hoje é o australiano Byron Sharp, autor do livro How Brands Grow.
No livro, ele mostra o resultado de estudos de pesquisas que envolveram esforços de marketing de diferentes indústrias, em setores variados, seja vendendo para consumidores (B2C) ou para empresas (B2B). E ao longo desse livro, ele traz à tona dois conceitos que são importantíssimos para gerar vendas: disponibilidade física e disponibilidade mental. É deles que a gente precisa se ocupar para gerar vendas, mais do que apenas alimentar um funil e torcer para alguma compra sair espremida no final.
O que é disponibilidade física?
“Disponibilidade física significa que os compradores podem adquirir a marca em versões, quantidade e preço que correspondam às suas necessidades de compra”, diz o Byron Sharp.
Durante muitas décadas, ter disponibilidade física era um problema da turma de operações e logística: garantir que o produto estava disponível na sua loja, na gôndola do mercado ou até mesmo no ponto de venda certo. E é algo que interfere muito nas vendas – se você discorda, sinta-se à vontade para usar a caixa de comentários para contar sobre como você nunca teve de escolher algo que não queria porque a primeira opção acabou.
Claro que marketing tinha seu peso dentro da disponibilidade física: ter um produto na altura dos olhos do consumidor é muito melhor do que estar na fileira mais próxima dos pés. É uma negociação do qual a turma do trade marketing se ocupa, e que envolve muitas variáveis. “Sabe quando a Red Bull faz o esforço de ter uma máquina própria no metrô? É justamente sobre isso: gerar disponibilidade física e mostrar que está fácil adquirir o produto”, explicou o Yokota no papo.
No universo digital, ter disponibilidade física pode significar muitas coisas – entre manter o produto dentro de estoque ou até mesmo fazer com que seja fácil de encontrá-lo. E isso, inclusive, tem a ver com performance: se você não investe em mídia paga, talvez o consumidor não te encontre ao fazer uma busca no Google. “E o Google hoje é o equivalente da gôndola do mercado: não tem como você não estar lá. É por isso que não dá pra desligar os gastos com performance”, comenta o Yokota.
(Se você quer entender melhor como dividir os gastos entre branding e performance, aliás, vale a pena ler esse texto aqui)
Outro case bacana sobre como a disponibilidade física é importante é o da fabricante de sucos americana Tropicana, que perdeu US$ 55 milhões depois de mudar seu logo: a marca ficou tão irreconhecível que os consumidores não conseguiam mais achá-la no mercado e, por isso, acabavam levando outra opção pra casa. Doido, né?
O que é disponibilidade mental?
“A disponibilidade mental de uma marca refere-se à probabilidade de que um comprador note, reconheça e/ou pense em uma marca em situações de compra. Isso depende da qualidade e quantidade de estruturas de memória relacionadas à marca.”, diz o Byron Sharp.
Se a gente tivesse um dicionário, provavelmente essa definição também apareceria no verbete “missão do branding”. É isso o que o branding precisa fazer: ocupar um espaço na cabeça do consumidor para que, caso ele precise do seu produto, ele se lembre de você. “Se alguém tá com fome na hora do almoço e lembra do seu restaurante, isso é um golaço do branding – e não listar as marcas que você conhece ou um check de awareness genérico”, disse o Yokota.
Uma outra analogia legal para entender a disponibilidade mental é comparar sua própria memória com o resultado de uma busca no Google. Quais marcas aparecem listadas nos resultados da sua memória quando chegam cinco amigos na sua casa e você não tem nenhuma bebida gelada para oferecer? Você deve pensar em duas ou três marcas que têm mais disponibilidade mental na sua memória para esse momento de compra.
Dá até pra fazer outro exercício, dessa vez em grupo: ao perguntar para eles qual é a bebida que eles preferem, você pode também descobrir a disponibilidade mental de bebidas dentro da sua turma.
Mas eu devo jogar o funil de marketing fora?
A resposta simples é: claro que não!
Existem ótimas razões para utilizar um funil de marketing. Um deles é organizar os esforços do time, entendendo que tarefas diferentes podem auxiliar consumidores em diferentes etapas de sua jornada – e que consumidores têm percepções e níveis de conhecimento diferentes sobre a sua marca, sendo necessário educá-los. Para quem tem uma marca B2B, usar o funil para planejar conteúdos e campanhas pode ser extremamente relevante.
Além disso, o funil também explicita que a função de todo mundo que trabalha com marketing é gerar vendas, mesmo que muita gente acredite que a missão de branding é produzir peças belas e etéreas. Awareness e prêmios em Cannes, infelizmente, às vezes podem não gerar resultado nenhum.
Da mesma forma, não dá para achar que o funil se resolve por si só, que basta atingir um monte de gente com ações de topo de funil que alguém vai comprar. “O que gera crescimento das marcas, cientificamente, é a disponibilidade física e mental”, ressaltou mais uma vez o Yoko. E o Byron Sharp. E mais um monte de gente. Pense nisso.
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